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Rafaela Ferraz

Writer & Researcher

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Mortes Vivas

Photographing the Portuguese way of death: from museum to church, from anatomical skeleton to holy corpse.
Captions in PT, EN coming soon. Follow along on Instagram @mortesvivas

Capela dos Meninos de Palhavã, Lisboa
Sabem aquele jogo em que o chão é lava? Aqui o chão é vísceras de reis Portugueses. 👑 . Estamos na Capela dos Meninos de Palhavã, Lisboa. Aqui repousam dois dos filhos ilegítimos-mas-legitimados do Rei D. João V, mas não foi por eles que viemos. Viemos porque aqui também se encontram, em potes e potinhos enterrados debaixo do pavimento, os corações e demais órgãos de vários monarcas da quarta dinastia. (Os corpos, devidamente embalsamados, estão sepultados umas portas ao lado no Panteão dos Braganças.) . Corria o ano 2000 quando um destes potes, mais especificamente o que continha os restos mortais de D. João VI, foi levado para análise toxicológica no Instituto Superior Técnico. (D. João VI, relembremos, era pai de D. Pedro IV e D. Miguel, aqueles manos que começaram uma Guerra Civil porque não sabiam dialogar. Quem nunca?) Há 180 anos que se dizia que D. João VI morrera sob circunstâncias misteriosas, mas só uma análise visceral conseguiu atribuir ao monarca a sua causa de morte: a clássica intoxicação por arsénio.
Calcanhar de São Torcato, Museu de Alberto Sampaio
Corria o ano de 1637, nos arredores de Guimarães, quando um grupo de valorosos heróis se reuniu para abrir o túmulo de um tal São Torcato, missionário Cristão do século I. Como não poderia deixar de ser (ou não fosse esta uma história sobre santos e relíquias), encontraram o corpo do missionário em perfeito estado de conservação—tão lifelike, diziam, que até sangrava.⁠ ⁠ Tomado pela emoção, Rui Gomes Golias, cónego mestre-escola da Colegiada de Nossa Senhora da Oliveira, fez o que qualquer um de nós teria feito: arrancou o tornozelo do santo à dentada, e fugiu com ele para casa. 🤷 A relíquia em questão (que talvez seja um calcanhar, e não um tornozelo), repousa hoje no Museu de Alberto Sampaio, protegida de potenciais dentadas por duas camadas de vidro. Já nem vale a pena tentar.⁠
Cemitério da Lapa
Está oficialmente aberta a época das camélias cemiteriais! 🌺💀⁠ ⁠ Diz-se que a bela da Camellia japonica chegou à cidade do Porto, pelas mãos de um cavalheiro Inglês, em 1810. Nos dias que correm podemos ver esta flor em tudo o que é praça, pracinha e praceta, mas haverá melhor cenário para uma flor tão tipicamente invernal do que um cemitério oitocentista? (Tenho as minha dúvidas.)⁠ ⁠ O cemitério da Lapa, por exemplo, é o cenário perfeito para iniciar uma tour das camélias Portuenses. Construído em 1833 para albergar as vítimas mortais de uma monumental epidemia de cólera, é popularmente conhecido como o cemitério mais antigo do Porto—e o primeiro cemitério romântico do país.
Museu de Anatomia Prof. Nuno Grande (ICBAS)
Esta peça do Museu de Anatomia Prof. Nuno Grande tem um aspecto fisicamente curioso (e não me refiro ao seu perma-sorriso). A verdade, animadamente contada pelo criador da peça em questão... é que lhe faltam algumas veias.⁠ António Costa Silva, técnico no Departamento de Anatomia do ICBAS, criou esta peça através da injecção de resinas líquidas coloridas nas artérias (a vermelho) e veias (a azul) de um cadáver doado à instituição. Este tipo de processo é feito "às cegas" no cadáver ainda intacto, pelo que não se consegue acompanhar visualmente. Na prática, assume-se que o material vai preencher a totalidade do sistema vascular, e faz-se figas para que não existam rupturas que impeçam que isso aconteça.⁠ Feita a injecção, o cadáver é macerado (i.e. decomposto de forma controlada) de forma a dissolver as partes moles. Pele, músculos, órgãos internos, tudo isto é decomposto de forma a revelar o esqueleto e as resinas previamente injectadas; nada mais, nada menos.⁠ Só nesta fase do processo é que o departamento de anatomia se apercebeu do acidente de percurso: devido a uma ruptura no sistema venoso, a resina não preenchera parte das veias do cadáver. A peça estava "incompleta" mas, não havendo nada a fazer, lá seguiu para exposição no museu anatómico—ligeiramente defeituosa, sim, mas claramente bem-disposta.⁠
Museu de Anatomia Prof. Nuno Grande (ICBAS)
Localizado no edifício do ICBAS, perto do Palácio de Cristal, o Museu de Anatomia Prof. Nuno Grande exibe preparações anatómicas, tanto humanas como animais, que vão do mais tradicional (órgãos em frascos) ao mais inovador (um corpo inteiro, minuciosamente dissecado, igualmente num frasco).⁠ É um espaço essencialmente universitário, pelo que é utilizado diariamente como sala de aula para alunos de anatomia (e ocasionalmente belas-artes). Pode ser visitado pelo público geral, mas apenas com marcação prévia (que pode ser feita no site do ICBAS).
“Artigos para Armadores”
Já lá vai o tempo em que se vendiam "artigos para armadores" nos números 33 e 35 da Rua da Fábrica, Porto. ⁠ ⁠ E já lá vai, também, o uso corrente da palavra "armador". Hoje preferimos "agente funerário"—mas vai tudo dar mais ou menos ao mesmo. 🤷
Cemitério dos Prazeres
O cemitério dos Prazeres é bem capaz de ser o mais turisticamente polivalente do nosso país. Os seus 12 hectares albergam não só a maior e mais antiga concentração de ciprestes da Península Ibérica, mas também o maior jazigo familiar da Europa.⁠ ⁠ E para quem quiser visitar os Prazeres na primavera (que já vai tão longe), ainda há um extra: é um dos melhores spots da capital para ver jacarandás em flor.
Santinho de Beire
Velas deixadas ao Santinho de Beire no cemitério de Beire, Paredes. O "santinho", que se encontra actualmente numa capela anexa ao cemitério, é na verdade o corpo (leia-se: cadáver) incorrupto de António Moreira Lopes, que morreu em 1907 e nunca se decompôs.
Santinho de Beire
Haverá melhor foto para inaugurar uma conta chamada "Mortes Vivas" do que uma campa com três datas? O defunto em questão, António Moreira Lopes, nasceu em 1832, morreu em 1907, e "apareceu" em 1972. Esta aparição, longe de ser espiritual, refere-se ao facto de o corpo de António ter sido exumado e encontrado intacto, sem grandes sinais de decomposição, quase 70 anos anos após a sua morte. Foi este incrível estado de preservação que levou a que António fosse considerado santo pelos habitantes de Beire, Paredes. O seu cadáver foi colocado em exposição numa capela anexa ao cemitério e lá continua até hoje, sempre pronto a receber crentes e curiosos. Por aqui, quem já visitou este famoso "Santinho de Beire"?

About

Rafaela Ferraz is a writer focused on strange, slightly macabre, and often overlooked chapters of Portuguese history. Her work has appeared in Atlas Obscura, Catapult, The Order of the Good Death, and TalkDeath, among others. LEARN MORE

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